27 dezembro 2008

EM ÁGUAS DE BACALHAU


Ao jantar, dei comigo num registo tão surrealista como o de algumas coisas que acontecem à nossa volta. Percebi, por fim, a razão da tradição do fiel amigo com batata cozida, legumes e azeite, se manter de pedra e cal, na ceia de Natal. É que, definitivamente, na cidade e no país, a impunidade está à tona e tudo o resto é deixado em águas de bacalhau.

21 dezembro 2008

SAPATADA



Um jornalista iraquiano, Muntadar al-Zeidi, atirou dois sapatos a Bush. Diz Daniel Monteiro no Expresso: “Finalmente ficámos a conhecer as famosas armas de destruição maciça que os iraquianos tinham escondido”.
Sobre o mesmo tema, o editorial do prestigiado semanário, condenou a atitude do atirador furtivo, considerando que, do ponto de vista ético, era deplorável ter havido aproveitamento da condição de jornalista que se encontra em acção para manifestar uma posição política numa conferência de imprensa. Isso faria sentido, se alguém acreditasse que os jornalistas são virgens neutras e sem opinião e que não usam as suas posições políticas quando exercem a profissão, e que o fazem muitas vezes de forma muito mais perigosa, porque o disfarçadamente.
É por isso que prefiro a franqueza genuína de Yvonne Ridley, jornalista inglesa que, no mesmo jornal, aplaudiu a ousadia do seu colega iraquiano. O iraquiano, quando atirou os sapatos ao primeiro responsável por uma guerra iníqua, disse que o fazia pelas viúvas e órfãos que resultam dessa aventura que tem na sua génese a manutenção da influência norte-americana na região e o abocanhar do petróleo que por lá existe. Yvonne defende o colega de profissão dizendo que ele não devia ser castigado por se ter expressado daquela forma, pois muita gente pensa que Bush é um criminoso de guerra, e que, como iraquiano, ele tinha o direito de vazar as frustrações.
Claro que, a dúvida também nos ocorre. Enquanto jornalista deve-se ser imparcial e reportar os factos tal como são. Mas, é óbvio que, ali, a mágoa do cidadão, sobrepôs-se à profissão. Na circunstância, isso é compreensível. “Quaisquer que sejam os protocolos que quebrou, não matou ninguém e o seu acto isolado de desafio ao homem mais poderoso do mundo trouxe um pouco de alegria a uma região que tem sido privada de tanta coisa. Paremos com as denúncias bombásticas e dêmos ao homem uma medalha…e um par de sapatos novos”, concluiu Yvonne Ridley.
Entretanto, enquanto a sapatada contra Bush passa a jogo na Internet, quem também ganhou foi a Baydan Shoes Company, a empresa turca que fabricou os sapatos que o jornalista arremessou contra George W. Bush, e que terá recebido 300.000 novos pedidos do modelo.
O empresário Ramazan Baydan, que é o criador do modelo agora famoso, disse que os sapatos são produzidos há cinco anos e vendidos principalmente a países do Médio Oriente e à Rússia. No Iraque custam cerca de 27 dólares. Baydan conta que o modelo que desenhou há dez anos se mantinha na moda. “Agora que tornou-se um símbolo de democracia para o povo do Iraque e fico emocionado com isso”, declarou o empresário, que garantiu que a família Zaidi terá sapatos grátis por toda a vida, ao mesmo tempo que criou um slogan para alavancar as suas vendas. “Adeus Bush. Bem-vinda, democracia”.
Ok! Já sei! Agora virá alguém dizer que foi Bush que levou a democracia ao Iraque e que se não fosse Bush, os iraquianos continuariam debaixo da repressão do facínora Sddam Hussain, enforcado no penúltimo dia de 2006, num contexto político e jurídico muito pouco dignificante, que em nada engrandece a verdadeira democracia.

18 dezembro 2008

UMA QUESTÃO DE ESQUERDA


«O PS mudou de posição. É preciso reconstruir a esquerda dentro ou fora do PS, não tenho medo de dizê-lo», disse Manuel Alegre, esclarecendo que não é obrigatório que seja «protagonista» de uma nova solução política.
Manuel Alegre, ao SOL

Acho que é preciso reconfigurar a esquerda portuguesa mas isso não se faz sem os eleitores, militantes e simpatizantes do Partido Socialista. Não estou interessado em criar um clubezinho. Quero que a democracia seja clara e transparente. Que as forças conservadoras se assumam e que a esquerda seja esquerda, é isso que eu quero.”

Manuel Alegre: Não estou interessado em formar um clubezinho, in Público 17.12.2008
UMA QUESTÃO DE ESQUERDA
Baptista-Bastos, escritor e jornalista


As televisões e as rádios fizeram, nestes dias, uma pergunta aflita: Portugal precisa de um novo partido à Esquerda? A inquietação provinha da circunstância de um grupo de pessoas se ter reunido na Aula Magna, para confirmar o que toda a gente sabe: o Partido Socialista não é peva socialista. Manuel Alegre foi o rosto do conclave e, um pouco irado, falou "neste" PS como a absurda negação de um "outro." A verdade é que nunca houve "outro." Desde a "fundação", o PS foi uma espécie de elaboração ininteligível, com estuques róseos. Vale a pena recordar: logo no PREC, o grito d'alma dos militantes era: "Partido Socialista, partido marxista!" Depois, o vozear amaciou, até desaparecer numa gaveta onde se guardou, até hoje, o "socialismo."
Estou em crer que Portugal não precisa de um novo partido à Esquerda. O que Portugal precisa é de que o PS seja, efectivamente, um partido de Esquerda ou que, em definitivo, deixe de dizer uma coisa e faça outra. Em suma: não se trata de argúcia, trata-se de ética.
A reunião na Aula Magna não prefigurou um país fantomático. Representou, no meu entender, um outro modo de reflectir o descontentamento generalizado. Nenhum dos assistentes era, meramente, decorativo: eles exprimiam uma intenção realmente crítica, com a única legitimação da vida que estamos a viver. A sua reprovação dos métodos e das práticas deste Governo não significa que pensassem na criação de um novo partido de Esquerda. Porque seria não só absurdo como, sobretudo, inútil. As próprias reivindicações ideológicas da assembleia ilustram, apenas, uma fidelidade: às propostas de Abril, sobre as quais o PS tripudiou, miseravelmente. Talvez esta "fé" surja como um patético anacronismo. Talvez corresponda a um imaginário anterior, e já delido. Mas convenciona o mal-estar desesperado e obsidiante que se colou à nossa vida.
Sabe-se: José Sócrates não serve. Transformou a política numa tagarelice. A imprecisão da sua ideologia confunde-se com a paixão do poder, e a relação entre ambas compromete, irremediavelmente, o nosso futuro e o nosso destino. A sua maneira fisiológica de dizer as coisas é, quase sempre, ocasional. Embora uma análise textual revelasse a natureza rudimentar do discurso. Não há interlocutores para Sócrates, e, acaso, o encontro na Aula Magna fosse a urgência e a necessidade de um largo sector da Esquerda "silenciosa" proclamar outra exigência política. Numa manifestação desta índole, o PCP não deveria ausentar-se. Cedeu a um preconceito histórico que tem minado a Esquerda, e não só em Portugal. O que está em causa é a prioridade de se escapar, tanto à hegemonia como à subordinação. O PCP faz parte da Esquerda - mas não é "a" Esquerda.

in Diário de Notícias, ed. 2008.12.17

A CRISE E OS MILHÕES



O que Mário Soares nos diz, e diz para quem quizer ouvir...
"A crise aprofunda-se e generaliza-se. Os Estados desviam milhões, que vêm directamente dos bolsos dos contribuintes, para evitar as falências de bancos mal geridos ou que se meteram em escandalosas negociatas. Será necessário. Mas o povo pergunta: e as roubalheiras, ficam impunes? E o sistema que as permitiu - os paraísos fiscais -, os chorudos vencimentos (multimilionários) de gestores incompetentes e pouco sérios, ficam na mesma? E os auditores que fecharam os olhos - ou não os abriram suficientemente - e os dirigentes políticos que se acomodaram ao sistema, não agiram e nem sequer alertaram, continuam nos mesmos lugares cimeiros, limitando-se a pedir, agora, mais intervenções do Estado, com a mesma desfaçatez com que antes reclamavam "menos Estado" e mais e mais privatizações?Pedem-se e pediram-se sacrifícios para cumprir as metas do défice, impostas por Bruxelas. Mas, ao mesmo tempo, os multimilionários engordaram - os mesmos que agora emagreceram na roleta russa das economias de casino - e os responsáveis políticos (os mesmos, por quase toda a Europa) não pensam em mudar o paradigma ou não anunciam essa intenção e não explicam sequer aos eleitores comuns, os eternos sacrificados, como vão gastar o dinheiro que utilizam para salvar os bancos e as grandes empresas da falência, aparentemente deixando tudo na mesma? E querem depois o voto desses mesmos eleitores, sem os informar seriamente nem esclarecer? É demais! É sabido: quem semeia ventos colhe tempestades...(...)"

in "A CRISE E OS MILHÕES", DN, edição de 2008.12.16


17 dezembro 2008

TRIAGEM DE WINCHESTER


Imaginem um partido político a criar um espaço cibernético para ligar militantes e simpatizantes numa sala on-line para o encontro e o debate de ideias, um espaço interno de liberdade de expressão.
É bonito não é?
Agora imaginem o mesmo partido, inopinadamente, a fazer a triagem das opiniões que percorrem os corredores individuais até à sala do colectivo. Imaginem a seguir um ladino sucedâneo do lápis azul de outrora, a rasgar algumas opiniões por se atreverem a criticar a direcção do partido.
Ainda será bonito?
Imaginem, ainda, o que aconteceria a este post se ousasse levá-lo à sala on-line desse partido que mutila a democracia e auto-mutila a sua história para reconstruir uma sombra tenebrosa de si mesmo, nesta nova onda encapelada em nome dos supremos interesses partidários (o que é isso? Desde quando é do interesse partidário impedir-se a crítica à direcção do partido? Que invencionisse é essa?)
Talvez um tal partido não exista. Mesmo assim, a blogosfera afirma-se pelo exercício como um reduto e um autêntico espaço de liberdade. Por isso ele incomoda tanto, ao ponto de, sorrateiramente, se obrigar ao silêncio de alguns, sem que, quem os manda calar verifique no terreno se o que por eles é dito tem ou não algum fundo de verdade!
Talvez um tal partido não exista, apenas porque o número dos que não acreditam que isso seja possível em democracia ainda seja pequeno!
Talvez um tal partido não exista, e o tal espaço criado em nome da transparência, da liberdade de expressão e do debate de ideias não tenha descambado numa farsa.
Se existisse um tal partido, convocaria à memória o meu amigo Manuel Lopes para apontar como ele disse um dia, em relação a um homem do Porto que copiava os modos de desprezo da capital perante os provincianos do norte: Já estão contaminados!
Eu não gostaria que um tal partido existisse.

14 dezembro 2008

CAPÍTULO NEGRO



“Devemos encerrar a era Bush com uma Comissão de Verdade, que determine como fechar este capítulo negro da história dos Estados Unidos.”


Kenneth Roth, director da ONG Human Rights Watch, em entrevista ao diário espanhol “El País”

À PROCURA DA NOVA ESQUERDA


"O grande tabu que tem de se quebrar: o de que há uma esquerda que, quando chega ao Governo, deixa de ser praticante de politicas de esquerda, e há outras esquerdas que se refugiam no contra-poder"

Manuel Alegre

13 dezembro 2008

STUDY CASE

imagem publicada por ppramada.blogspot



Imagine-se num país imaginário.
Fulano é militante do partido e funcionário do organismo público há muitos anos. Há tantos quantos os que partilha em diversas cumplicidades.
Faz favores e recebe favores. Há muito que tira vantagem da sua posição numa instituição e noutra, e tudo ia correndo às mil maravilhas: ganhou horas extraordinárias fictícias para pagamento da fidelidade partidária; teve carro à disposição, à custa do erário público, fora do horário público; arrecadou lugares no mesmo organismo para familiares e amigos, desde que também o fosse do partido. Em contrapartida, foi ininterruptamente cabo eleitoral, com dinâmica para todas as necessidades, e semi-serrou os olhos às irregularidades dos que lhe facultavam as vantagens.
Tudo ia correndo às mil maravilhas, até que a rotineira e perigosa sensação de impunidade, abriu brechas ao descuido, e Fulano, refém da sua própria ambição, exagerou na colheita. De tal sorte que foi inevitável investigar.
O investigador, por certo recebendo ordens dadas a contra gosto pelos responsáveis do organismo, acabou por concluir pelo desvio do pilim e de materiais comprados que não chegaram ao destino, que alegadamente o justificavam na encomenda exagerada, por terem sido desviados para o destino da merenda.
Fulano, a quem cabia a gestão da obra orçamentada em 5, acabou por ficar com a diferença do custo que atingiu, inacreditavelmente, 5 vezes 5! Cinco vezes qualquer coisa é coisa demais. É uma tranca no olho que não pode ser disfarçada com a cor das lentes. Vai daí, o investigador nomeado investigou. Encarregado de relatar, relatou. O decisor que deve decidir ficou com duas opções que coloco ao leitor para decidir também ou tão bem!

Hipótese A
O decisor tem uma conversinha de trás da orelha com Fulano, encosta-o à prateleira, afasta-o do campo de outras oportunidades de delito antes que sobre para si próprio, promete-lhe uma saída sem alarido para que não fique sem a reforma, e abafa o caso para não ter que dar mais explicações. Ah! Continuará a contar com a discrição de Fulano em relação a assuntos delicados, e com a sua colaboração em próximas campanhas.

Hipótese B
O decisor promove um sério e transparente inquérito disciplinar, enquanto determina a suspensão de funções de Fulano. Vem a concluir, à face da lei, que tendo havido delapidação e apropriação indevida do erário público, deve ser aplicado ao infractor o mais alto castigo do estatuto da função pública, a expulsão. Ao mesmo tempo, por ser um caso de polícia apresenta queixa ao Ministério Público contra Fulano e contra Sicrano, respectivamente, o mau funcionário e o fornecedor que fingiu vender materiais para a obra e que em vez de os entregar no estaleiro os descarregou no local indicado pelo outro.

Este é um caso hipotético. Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência. Por isso, como disse Eça de Queirós a Bulhão Pato, não se metam nas minhas personagens.
É apenas um exercício. Um treino da capacidade decisória num Estado de Direito Democrático.
Ora, o que escolheria você? A hipótese A ou a B?
Por mim, não tenho a menor dúvida, até porque a Boa iniciativa começa pela mesma inicial!

08 dezembro 2008

TOIROS II


"Caçar como diversão? Fazer sofrer um touro na praça para que o público desfrute e uns quantos façam negócio? Façam o quiserem, mas não o partilho."


Rainha Sofia de Espanha,
num livro que foi publicado recentemente por ocasião do seu 70º. aniversário.




07 dezembro 2008

TOIROS

foto de Fernando Salgueiro


CÂMARA COMPRA PRAÇA E ACABA COM TOURADAS, li há uns dias atrás, no Diário de Notícias.
Com epicentro em Viana do Castelo, a esperança voltou a ter côr à minha volta.
Na Póvoa, a Praça de Touros foi adquirida pelo Município há mais de vinte anos.
Na altura era membro da Assembleia Municipal e votei a favor dessa aquisição.
Aparentemente, na Póvoa, seria mais fácil dar o passo seguinte: acabar com touradas, garraiadas e afins.
Mas na Póvoa, prisioneiros dos seus estranhos preconceitos, os decisores políticos gastam mais energia a exibir a brutalidade da sua força eleitoral do que a orientá-la para concretização da modernidade.
Na Póvoa, o padroeiro anda demasiado ocupado com os naufrágios em que vai rodopiando o poder local, que se arrasta por uma maioria autocrática, arrogante e obstinada. Com o naufrágio das piscinas na memória, e o presságio do naufrágio do bom senso, o santo faz tudo para manter a possibilidade da inteligência emergir do confronto com as ondas encapeladas do alto mar da mediocridade política. Tão oupado que está nesta espécie de sarilho que tenta trazer do fundo uma luz de sabedoria, S. Pedro não tem tido tempo sequer para convidar a ajuda de outros santos.
Em maior sossego, lá no monte sereno onde acontecem horizontes mais amplos, por certo Santa Luzia ilumina sem dificuldade as gentes do Lima.

Em 17 de Março de 2008, tentei e não consegui!

Tornar a Póvoa de Varzim, a minha terra, a terra que me havia elegido Vereador, a PRIMEIRA CIDADE ANTI-TOURADA DE PORTUGAL!

Uma cítrica maioria - que envergonha a social-democriacia - chumbou a proposta sem sequer arriscar um argumento. Usou apenas o argumento do exercício de um poder, que, ainda não percebeu, lhe foi emprestado e é efémero.

O Presidente DEFENSOR DE MOURA tem todas as condições para o conseguir!
Aqui o saúdo, saudando os que o acompanham. E saúdo a caminhada que se inicia em Viana do Castelo com a certeza de um tempo de maior dignidade que engrandecerá o Homem!

E aqui lhe deixo o bom desafio ao passo seguinte:
tornar Viana do Castelo, mais a norte e com mais norte na mente e na alma, a PRIMEIRA CIDADE ANTI-TOURADA DE PORTUGAL!

01 dezembro 2008

FABRICAÇÃO DE SUBJECTIVIDADES OBEDIENTES




Um filósofo internacionalmente reconhecido...
...que nos dá que pensar, digo eu!

“ (…)
Quebrou-se-lhes a espinha, juntando ao desespero anterior um desespero maior. O ambiente das escolas é agora de ansiedade, com a corrida ao cumprimento das centenas de regulamentações que desabam todos os dias do Ministério para os docentes lerem, interpretarem, aplicarem. Uma burocracia inimaginável, que devora as horas dos professores, em aflição constante para conciliar com uma vida privada cada vez mais residual e mesmo com a preparação das lições, em desnorte com as novas normas (tal professor de filosofia a dar aulas de baby-sitting em cursos profissionalizantes), tudo isto sob a ameaça da despromoção e do resultado da avaliação que pode terminar no desemprego.
(…)
No processo de domesticação da sociedade, a teimosia do primeiro-ministro e da sua ministra da Educação, representam muito mais do que simples traços psicológicos. São técnicas terríveis de dominação, de castração e de esmagamento, e de fabricação de subjectividades obedientes. Conviria chamar a este mecanismo tão eficaz, ”a desactivação da acção”. É a não inscrição elevada ao estatuto sofisticado de uma técnica política, à maneira de certos processos psicóticos.”


José Gil, filósofo, Visão, 2 de Outubro de 2008

ESTACA ZERO


1. O Plano Director Municipal da Póvoa de Varzim entrou em vigor em Agosto de 1995, cerca de um ano após a tomada de posse de Macedo Vieira no seu primeiro mandato como Presidente da Câmara. Era Primeiro-Ministro, Cavaco Silva.
2. Um ano de mandato decorrido não foi suficiente para elaborar um tão importante quanto complexo instrumento de gestão urbanística. Na verdade, os trabalhos que estão na sua génese foram iniciados no último mandato de Manuel Vaz.
A dupla Aires/Macedo, para além dos projectos e dos milhões herdados do seu antecessor, também herdou o PDM praticamente concluído, e ter-se-á limitado a fazer-lhe acertos de pormenor.
3. O prazo máximo de vigência do PDM é de 10 anos, a contar da sua entrada em vigor, devendo a revisão, de acordo com a lei ser realizada antes de decorrido esse prazo.
4. Isto é, em Agosto de 2005 o PDM da Póvoa anunciava o fim dos seus dias!
Se a dupla Aires/Macedo fosse realmente competente, teria já em curso, nessa altura, todos os estudos e trabalhos necessários à sua revisão.
E se fosse realmente democrática, o que implica ter uma visão e uma prática objectiva no sentido do estímulo à participação dos cidadãos (afinal os destinatários dos efeitos do PDM), também teria organizado sessões informativas e debates, envolvendo o maior número possível de pessoas e organizações locais num espaço amplo de reflexão e discussão sobre o futuro do Concelho.
5. Como não é, nem uma coisa nem outra, quando o novo Executivo, saído das Eleições de Outubro, tomou posse, a única estaca que se conhecia tinha o número zero.
6. Citando o Prof. Costa Lobo, é minha convicção que “o PDM tem que ser um serviço para optimizar soluções dos problemas do território, tem que ser uma festa, mas exige a colaboração de todos, a tal exigência social e moral a que todos nos obrigamos como seres humanos conscientes e bem formados.”
7. Por isso, em
22 de Novembro de 2005, considerando que o PDM da Póvoa é um instrumento demasiado importante para permanecer desconhecido e inactivo, apresentámos uma proposta no sentido de, tão breve quanto possível, ser feito um Ponto de Situação do processo de revisão do PDM em reunião do Executivo Municipal, e de ser elaborado e concretizado um programa de acções constituído por exposições e conferências temáticas (entre outras, habitação, mobilidade, equipamentos, ambiente e paisagem, sinalética), bem como a criação e divulgação de um sistema amigável de recolha de comentários e sugestões dos Munícipes.
8. Com a habitual e intricada arrogância que lhe vai na alma, a maioria PSD liderada pela dupla Aires/Macedo chumbou a proposta.
9. Mais de três anos depois, tudo permanecia na mesma: os trabalhos de revisão do PDM, se é que estavam realmente em curso, continuavam a ser desenvolvidos no mais completo segredo, afastado do conhecimento dos Vereadores da Oposição, da Assembleia Municipal e da população em geral. Consta que forneceram umas plantas aos presidentes de junta, não sei se a todos. Mas, a análise das consequências do PDM de primeira geração, cuja validade se esfumara antes, e o debate sobre o modelo de desenvolvimento, sobre os objectivos futuros e os instrumentos e medidas a implementar para os próximos dez anos, continuavam por fazer com a transparência e a participação que o nosso futuro comum exige!
10. Por isso, na última reunião de Câmara em que participei,
a 17 de Março de 2008, não podia deixar de voltar a propor tal desiderato. Os meus camaradas, tal como antes, subscreveram a renovada proposta.
11. Com a habitual e intricada arrogância que lhe vai na alma, a maioria PSD liderada pela dupla Aires/Macedo voltou a chumbar a proposta.
12. Que se saiba, só a maioria PSD e quem a dupla Aires/Macedo ela entende informar, conhece as propostas de revisão do PDM! Os vereadores da Oposição, a Assembleia Municipal e os cidadãos em geral vão sendo mantidos à margem, na mais completa ignorância!
Transparência? Não! Águas turvas...
Informação? Não! Porque havemos de saber tanto como eles?
Participação? Não, que isso, nas palavras do formidável presidente, seria excesso de Democracia…
13. Não é crível que a Maioria PSD conclua a revisão do PDM neste mandato! Aliás, aproximando-se novo ciclo eleitoral, é mesmo improvável que se disponha a qualquer debate que lhe possa trazer dificuldades e quiçá, a perda de votos.
O debate político está marcado pelo fatalismo, pela política do «tem que ser», do «não pode ser de outra maneira». Por isso tem sido fácil manter o debate urbanístico num nível incipiente. As soluções sobre política urbanística são servidas aos cidadãos já «prontas», poupando-lhes o incómodo da participação.
A dupla Aires/Macedo é perita nesta forma de actuar.
O mais certo é que, numa farsa semelhante à das outras vezes, venha a fazer uma ou duas grandes sessões… numa discussão pública nos mínimos que a lei exige, para simular democracia…mas, só depois de terem tudo arranjado e decidido!
Tenho quase a certeza de que isso só acontecerá durante o próximo mandato!
Entretanto, o resultado é quatro anos perdidos por manifesta incompetência e irresponsabilidade políticas!

A questão é: quando é que as Oposições exigem de forma veemente uma outra atitude, mais amiga da cidadania, da cidade e dos cidadãos?


EM RODAPÉ
1 de Dezembro de 2008. Dia da Restauração da Independência. Dia em que se celebra a recuperação da essência da portugalidade face ao jugo invasor de Espanha. Dia que gostaria que fosse, também, o da independência em relação à mediocridade e à arrogância que engana a Democracia.
Num dia igual ao de hoje, num fundo preto para evidenciar melhor todas as cores, abri na blogosfera o meu espaço de liberdade de expressão, um espaço para tentativas de reflexão e de escrita, num tempo em que, noutras esferas comunicacionais, o pluralismo e a liberdade são politicamente incorrectos.
No Cá-70, cá continuarei tentando…