28 outubro 2008

DEBAIXO DO TAPETE



Há um curioso hábito nesta terra: sempre que alguém “lança” um livro, lá aparece um político no poder para “botar faladura”.
O hábito, que mistura convenientemente marketing político com cultura, serve-se dos incautos para a mercearia dos votos. Ora, há quem tenha tão enraizado o método, que não perde pitada, somando presenças nos actos sociais, para ser visto, parecer instruído e culto, e tentar convencer-nos que, se não fosse por si, as espigas, em vez de crescer para cima, cresceriam para baixo, como sugeriu Brecht!

Numa destas tardes de sábado, um desses actores lá estava. Estranhamente agitado mexia-se na cadeira. Preso pelo peso do olhar que lançara quase todas as ancoras ao chão, soltou palavras com risinhos à mistura, como faíscas despropositadas que deixavam a suspeita de virem “Debaixo do Tapete”.
Debaixo do Tapete”, o mais recente título do doutor Mateus, serviu para o actor concluir - pelos vistos após aturada leitura -, que a trama se passaria na mesma terra onde, naquela tarde de sábado se falava do livro... por causa do casino, por causa da praia…, por causa da falta de causas, apeteceu-me rematar.
E ria-se. Ria-se, sempre que insistia na tese de que, segundo a sua pessoalíssima opinião, a trama se passaria na mesma terra onde vivia o escritor, onde ele também parecia viver e onde muita coisa, afinal, se escapa para “Debaixo do Tapete”.
Ria-se, e de cada vez que se ria, eu não percebia qualquer justificação para o misterioso riso!

Em casa, por fim, depois de autografado o livro, decidi penetrar páginas a dentro. Inopinadamente, ao virar da esquina, quando me aproximava do final do segundo capítulo, deparei-me com este saboroso trecho:

Que se lixe a lei! – pensou ele um dia. Não foi tarde, nem cedo. Fez uns cálculos. Contando com o tempo do serviço militar, ficou em casa cinco dias seguidos, sem dar cavaco a ninguém. Quando se apresentou ao serviço, suspenderam-no e instauraram-lhe um procedimento disciplinar. Quando recebeu a acusação não fez caso. Passados dois meses, recebeu a decisão que esperava: reforma compulsiva. Tinha conseguido pela infracção ao estatuto disciplinar dos funcionários públicos o que pela via legal não lhe seria concedido, por lhe faltar o tempo de serviço necessário à aposentação.” (in "Debaixo do Tapete", Carlos Mateus)

Interessante semelhança com outra história contada por Joaquim Fidalgo na edição de 26 de Janeiro de 2006, do jornal Público.

Ele era, dizem, um funcionário exemplar da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim. Em cerca de dez anos de carreira, nunca faltara ao trabalho. E de repente, sem ninguém contar, dá uma falta injustificada. E logo a seguir outra, e outra... Cinco. Cinco faltas injustificadas. Caso grave! Deu processo disciplinar, ao fim de apenas duas semanas já havia relatório final. Foi o assunto à reunião de câmara e o funcionário recebeu a adequada punição (a segunda mais grave da administração pública, dizia o jornal): compulsivamente mandado para a reforma. E lá foi ele para casa, com uma reformazita de pouco mais de três mil euros mensais - 627 contos, para sermos precisos. Grande castigo, sim senhores!... Prematuramente aposentado, mas ainda cheio de força para trabalhar, bastaram mais duas semanas a este funcionário exemplar para ser convidado para nova função: administrador de uma empresa municipal. De que câmara? Da da Póvoa de Varzim, obviamente... E lá ficou o nosso homem a acumular a reforma antecipada de seiscentos e tal contos mensais com outros tantos centos, não sei quantos, do novo cargo numa administração. Bem vistas as coisas, não lhe correra mal a vida...(…)”

Percebi, finalmente, que a risadinha nervosa não era mais do que um estratagema para sacudir a água do capote. Na verdade, ele tinha boas razões para propor como tese que a trama que o escritor atirara para “Debaixo do Tapete” tinha como espaço de acção a mesma terra onde ele próprio ajudara a disfarçar a historieta parecida de que fala Fidalgo.
A risadinha, repetida e sublinhada, servia para fingir que não era nada com ele. E servia, também, para fazer chacota de todos nós. É que, enquanto o Inquiridor (que o Tribunal viria depois a condenar por crime de abuso de poder…) conduzia a reunião que enegreceu a Câmara, o outro e ele estavam na América Latina. Não participaram da decisão formal, é verdade. Mas, só por hipocrisia e cobardia política tentam desresponsabilizar-se. Que se saiba, não ficaram por lá. Regressaram e nada fizeram para remendar a trapalhada. Aceitaram tudo com normalidade. Nada fizeram para corrigir o truque que deu ao “funcionário exemplar” a oportunidade de ganhar ilegitimamente, em cada mês, mais uns salários mínimos de reforma. Pior: duas semanas depois, sancionaram a sua nomeação para a presidência de uma empresa municipal!

Estas e outras vão sendo atiradas para “Debaixo do Tapete” diante de um confrangedor encolher de ombros colectivo!
Mas, nem uma coisa, nem outra me dão vontade de rir…

26 outubro 2008

DE MORRINHANHA

ALAN GREENSPAN, ex-presidente da Reserva Federal dos EUA (1987-2006), durante uma audição no Congresso norte-americano.
in Expresso, edição de 2008.10.25

COMETI UM ERRO AO CONFIAR QUE O LIVRE MERCADO PODE REGULAR-SE A SI PRÓPRIO

Permitam-me a ironia. Quem julga que é este senhor? Como é que decide que, mais do que uma simples ilusão, o seu convencimento foi um erro, quando outros, seguramente informados pelo divino e a abarrotar da sabedoria proporcional ao número de votos, justificam permanentemente a sua fuga às responsabilidades, numa irresponsável recusa de cumprir as competências que a Lei lhes confere, argumentando, por tudo e por nada, que cabe ao Mercado resolver os problemas?

Recuemos no tempo, trazendo aqui dois excertos jornalísticos cujo conteúdo, no mínimo, merece reflexão.

Na entrevista a Diamantino, ficou a a saber-se que "o PSD argumenta, ainda, que deve ser o mercado a funcionar(…)”
ANA MARQUES, JN, edição de 2007.06.06

O PS propunha, explicou Silva Garcia, "uma rede de transportes públicos urbanos intermunicipal, intermodal, sustentável", cuja proposta foi, inclusive, "amplamente debatida e enriquecida" com outras experiências já no terreno. Uma proposta de um "novo paradigma de mobilidade" para a cidade, que "compete à Câmara definir"."A Câmara, o que tem feito é demitir-se desta competência para dizer que quem tem que resolver o problema da mobilidade é o mercado", explicou Garcia, lembrando que, até agora, "o mercado tem sido a negação de tudo isso", com sete operadores, 30 e tal carreiras, "de costas umas para as outras", criando uma "muito má imagem dos transportes públicos". (...)
ANA MARQUES, JN, edição de 2007.06.06

19 outubro 2008

O CRUZAMENTO DAS TORMENTAS E O PARQUE DA BOA ESPERANÇA II

As árvores abatidas por um subterrâneo...

Descobri, entretanto, outra utilidade para o parque da Boa Esperança, isto é, o Parque Dos Trezentos Milhões De Contos de Reis dos Monte Por Quarenta Anos Mais A Aprovação do Vieira e Dos Seus Satélites No Poder E Os Setecentos Mil De Nós Todos Por Via Do Instituto do Turismo.
Por provável distracção dos ilustres criadores do urbanismo local, a minha rua foi premiada com uma daquelas excessivas e caras caixas de vidro por onde se desce ao subterrâneo. Um dia destes, pelas dez e picos da manhã, debaixo duma chuva teimosamente miudinha, ao dobrar a esquina deparei-me com a caixa mágica, ou com a ideia mágica, já não sei bem. A verdade é que entrei, desci as escadas, e, sem me molhar, percorri as centenas de metros que me levaram até caixa de vidro idêntica junto ao Palácio da Justiça.
A paisagem era monótona porque apenas vi paredes e ausências… Mas evitei uma molha e os caprichos do vento que se exprime com mais agressividade no renovado canal da Avenida, depois de terem assassinado as árvores que lhe davam conforto urbano, ao mesmo tempo que escondiam a mediocridade da paisagem arquitectónica agora escancarada.
Durante a caminhada contei 30 carros estacionados, mas havia lugar para dez vezes mais.
Na sexta-feira passada voltei a usar o Parque da Boa Esperança, a quem chamam Eça, sem se importar de incomodar o escritor que viu, em coisas como esta, uma importação que “nos fica curto nas mangas, e ao mesmo tempo um provincianismo bacoco que chega fora de horas, quando os outros já fazem ao contrário por terem aprendido a lição.”.
Usei o parque pela segunda vez, de novo como uma alternativa pedonal à chuva, mais intensa por sinal.
De novo, entre a caixa de vidro plantada na esquina da minha rua, até à do Palácio da Justiça, voltei a contar uma trintena de carros...Olhei para o lado onde é suposto estar o mar e consegui ver raras pintas metálicas: podiam ser outros tantos carros num espaço para quase seiscentos.
Será que, afinal o problema do estacionamento na cidade foi resolvido de tal modo que este parque já não serve para mais nada, senão para circular a pé abrigado do vento e da chuva?
O parque vai servindo para o que não estava previsto. Só parece não servir para guardar os atomóveis que os combustíveis caros, e tendencialmente mais caros ainda, tornam cada vez mais insustentável a sua utilização, como se previu, diante das orelhas moucas dos que mantêm o pensamento amarelo e intermitente.
Diziam eles que faziam o parque para apoiar e dinamizar o comércio local… Não me admiraria se um dia destes alguém viesse sugerir que as lojas da avenida passassem a ter montras subterrâneas abertas para o parque! Apesar da pior qualidade do ar, era outra forma de dar utilidade ao subterrâneo da Boa Esperança.

O CRUZAMENTO DAS TORMENTAS E O PARQUE DA BOA ESPERANÇA I

Este foi durante dezenas de anos o cenário da Avenida, agora com roupagem de breu, autoestrada esganada.
Tal como tantas criaturas que se meteram nesta cidade, o Rui atravessava com crescente e redobrado receio o Cruzamento das Tormentas, ali ao pé do Mercado, onde a Mouzinho (via estruturante do PU) corta a EN 13. Durante muitos meses, o Rui andou encolhido, tristonho, pela probabilidade de, num dia qualquer, ser um dos protagonistas dos choques que se repetem diante da irresponsável indiferença dos que mantêm o pensamento amarelo e intermitente!
Na semana passada, o Rui apareceu-me descontraído e com uma alegria especial estampada no rosto. Tinha descoberto que, sempre vinha da marginal, podia entrar no parque e percorrer o subterrâneo até ao Hospital, rapidamente, sem filas de trânsito e sem se sujeitar ao Cruzamento das Tormentas. Por cerca de trinta cêntimos, para o Rui, o parque dos Monte com a aprovação do Vieira e dos seus satélites no poder, passou a ser da Boa Esperança!
Cá está uma utilidade que nunca me passou pela cabeça! Mas, terá passado pela cabeça dos brilhantes inventores deste equipamento que atrasa um modelo de cidade inspirado pelo conceito de desenvolvimento sustentável? Porque mantiveram em estranho segredo esta funcionalidade tão útil à segurança na estrada?

14 outubro 2008

PERPLEXIDADES CAPITAIS


Agora, que, nos Estados Unidos, na Europa dos 25 e até por cá, os milhões do Estado não faltaram para acudir à Banca (sem cuidar de responsabilizar quem promoveu o modelo neo-liberal, pelo comentário político, pela acção política concreta, ou na gestão da coisa a troco de mordomias escandalosas..), porque é que continuam a faltar os milhões do Estado para a cudir os pobres e combater a exclusão social e a fome?
Francis Fukuiama anunciou ao mundo em 1990 o triunfo do capitalismo e do neoliberalismo. É hoje ainda mais claro que Fukuiama e os seus satélites por todo o mundo nunca tiveram razão.
É urgente uma nova ideologia para se sobrepor a este modelo suportado por uma ideologia que é contra a Humanidade!

13 outubro 2008

ATOM DOM SABICHOM?


Acidente aparatoso faz um ferido na Avenida Mouzinho
Um ferido é resultado de um aparatoso acidente de viação no cruzamento da Avenida Mouzinho com a EN 13, ocorrido esta madrugada, por volta da 1hora envolvendo 2 veículos ligeiros. O ferido foi transportado ao hospital local. O acidente causou muitos danos materiais. Os automóveis ficaram destruídos - para se ter uma ideia, uma delas ficou a 20 metros do cruzamento. Para além disso houve uma boca-de-incêndio e semáforos bastante danificados. O excesso de velocidade foi a causa provável do sinistro. No cruzamento da Avenida Mouzinho com a EN 13 Este que tem semáforos intermitentes, têm-se registado vários acidentes nos últimos tempos.

Rádio Onda Viva, 2008-10-13
Consta que o Dom Sabichom acha que não é preciso estudar o assunto antes de fazer a obra, que é na prática praticando que se fazem as soluções para os problemas que não é preciso prever.
Por isso, numa estranha sabedoria saloia, impingiu-nos a obra e depois, quando começou o choque no cruzamento maravilhónico, anunciou que iria fazer uma análise de tráfego, bem analítica...
Afinal, se a fez, ela deve ter ficado logo aí, paralítica, presa numa prateleira igualmente sábia de um arquivo onde são possíveis outras tantas aventuras!
Enquanto isso, com luz intermitente, lá vão batendo os carros, nos carros, nos ossos dos que guiam os carros, nas bocas de incêndio que deviam gritar que algo vai mal no reino da Dinamarca, mas que apenas vomitam a água que eles metem nas nossas barbas, impunemente!
- Atom Dom Sabichom, quando nos apresenta a famosa soluçom?