24 dezembro 2005


A luz que nasce vai romper todas as cercas!
Um desejo para 2006 no Natal de 2005
foto de Helena Maria Milheiro, in 1000 Imagens

RAZÃO

Agressivo, ao introduzir o tema vociferou, pela terceira vez depois das seis da tarde, a picardia que usava para achincalhar: “Você, que tem a mania de que tem sempre razão…”. “Pode crer que tenho sempre razão!”, interrompi-o com veemência, olhando o nos olhos.
Ele atirou-se para trás. À volta da mesa, os outros rodopiaram até se concentrarem em mim como alvo a incendiar. Debaixo de testas franzidas, caninos subtilmente à vista anunciavam rosnadela envenenada…
“Tenho sempre razão, porque sou um animal racional! Não estarei sempre certo, é verdade. Mas, tenho sempre razão!”
A rosnadela suspensa desfez-se num latido desmaiado, sem perder o sentido interrogativo.
Não sei se perceberam!
Ele retomou o assunto que não chegara a iniciar e continuou a esvair-se em vulgaridades repetidas de outras vulgaridades que nos ocuparam o tempo sem substância que merecesse reflexão.
Os outros, prolongamentos dele – como insistiam em demonstrar sem margem para dúvidas – voltaram ao estado letárgico da mudez metódica para lhe dar o espaço e o tempo. A ele que, tirando o casado do poder efémero, é um animal racional como nós e às vezes está certo.

18 dezembro 2005

Bush estica... com o dedo no gatilho

Pouco antes do início da invasão ilegal do Iraque pelo exército norte-americano escrevi este artigo, posteriormente publicado no Póvoa Semanário.
1.
Nas Lajes, a Declaração de Guerra tira a máscara!
Chega a noite.
Não me refiro à obscuridade cíclica do movimento de rotação da terra, mas à que acontece pela tentativa cínica dos guardiões do Império em encarcerar a luz num ponto inalcançável!
Releio um recorte do Expresso. Donald Rumsfeld defendeu no Capitólio a opção pelos canhões. As despesas militares do governo americano vão passar de 379,9 mil milhões de dólares em 2003 para 483,6 mil milhões em 2009!
Nunca o militar penetrou a economia de modo tão radical” - diz o missionário A. Zanotteli (1) que, referindo o Banco Mundial, lembra que bastariam 13 mil milhões de dólares para se resolver os problemas da fome e da saúde.
Que mundo é esse que o Império se propõe moldar?

2.
O rearmamento militar serve a poderosíssima indústria de material de guerra.
Miguel Sousa Tavares defende que a história dos conflitos deste século só pode ser verdadeiramente entendida quando cruzada com a história empresarial dos fabricantes de armamento. Recordo e passo ao artigo de Nuno Guerreiro na Grande Reportagem de Junho de 1999. “Os Estados Unidos são o país do mundo que em mais conflitos se envolveu nos últimos cem anos. O século XX começa com tropas americanas a lutar nas Filipinas e acaba com os soldados de Clinton em combate nas Balcãs. Entre uma e outra intervenção, a América foi aprendendo a transformar a guerra numa fonte de receitas que hoje é crucial para o país. Actualmente, as empresas de armamento que fornecem o Pentágono estão entre os principais financiadores de Republicanos e Democratas. Só nos últimos dois anos, os gigantes da indústria bélica gastaram cerca de cinquenta milhões de dólares a mover influências junto de membros da Casa Branca – ou seja, quem decide onde, quando e como se travam os conflitos da América.” (2)
O século XXI começa com tropas americanas no Afeganistão e no Iraque...

3.
Regresso angustiado a um artigo recente de Alfredo Barroso (3). Bruce P.Jackson é presidente do Committee for the Liberation of Iraq do qual, ironicamente, não faz parte um único iraquiano, mas serve para apoiar a política belicista de Bush e tentar convencer o mundo da utilidade da guerra. Ao mesmo tempo, é presidente do US Committee to Expand NATO e, curiosamente, vice-presidente responsável da Lockheed-Martin que é, tão só, o principal fabricante de armamentos do planeta: só em 2002, os seus contratos militares ascenderam a 17 mil milhões de dólares!
Ocorre-me uma palavra: OBSCENO!

4.
A guerra contra o Iraque está decidida muito antes do 11 de Setembro. Não vale invocar este trágico e condenável acontecimento para justificar uma intervenção violenta como se o Iraque constituísse uma ameaça aos EUA: “seria necessário mostrar que existe uma ligação entre o Iraque e a Al-Qaeda. Até agora, nicles. As provas apresentadas são, pura e simplesmente ridículas.” (4)
Inventa-se o conceito de guerra preventiva: mais vale bater antes que nos batam! Mas, que mundo será este uma vez sujeito a um incomensurável poderio militar unilateral que, em cada momento, decide quem são os seus amigos e quais os inimigos a destruir, preventivamente?
O frenesim dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha em volta da ONU é apenas uma despudorada farsa no complexo processo de tentativa de iludir a opinião pública e tornar aceitável uma intervenção que até João Paulo II considera imoral e ilegal!
A guerra terá que acontecer para mostrar as mais recentes e sofisticadas máquinas de matar e destruir. Um Iraque fragilizado será o palco ideal para experiências reais que demonstrem a sua eficácia.
Mas, na noite escura em que nos querem enfiar, o mais certo é que Saddam, tal como Osama Bin Laden, acabará por se safar. Serão homens, mulheres e crianças como nós a sofrer dilacerado pela dor e pela morte, desta vez às mãos da democracia americana, que o toma como cobaia das novas tecnologias militares.
Os vassalos do Império, num estratagema de funil, atiram para o lado de Saddan quem não concorda com a guerra. O Primeiro-Ministro Durão Barroso envergonha Portugal: apoia a guerra à margem da Lei. Numa formulação simplista, hipócrita e uma desonestidade intelectual desmedida, argumenta que “temos que estar com os americanos porque eles são uma democracia e o Iraque é governado por um ditador sanguinário”.
Saddam é um impiedoso ditador! É um assassino cujas piores violências puderam beneficiar, a seu tempo, de apoio dos governos americano e britânico.
Lembro-me dos EUA encararem com prazer a guerra de Saddan contra o Irão, após sofrerem a humilhação de verem a sua embaixada em Teerão em situação de refém, vindo a fazer dele um aliado. E lembro-me dos Curdos, 4.000 dos quais foram assassinados com gás por ordem sua sem a menor reacção americana...
Sem dúvida que os iraquianos terão tudo a ganhar livrando-se dele.
Mas, haja coerência: se a justificação da guerra é Saddan ser um ditador sanguinário, proponha-se idêntica intervenção para derrubar outras ditaduras igualmente atentatórias dos direitos humanos, muitas das quais amigas dos EUA. Como esquecer duas décadas de apoio americano à Indonésia do facínora Suharto e a cumplicidade com a ocupação assassina de Timor?
Como ignorar, agora, a chantagem sobre os países do Conselho de Segurança da ONU e a ameaça de agir unilateralmente se a decisão não lhe for conveniente, quando muitos se esforçam por reforçar a importância do Direito Internacional? E como aceitar a impunidade dos EU e dos seus soldados perante o Tribunal Penal Internacional, ao mesmo tempo que Portugal, Espanha e Grã-Bretanha, entre outros, estão sujeitos a serem julgados e condenados pelo crime de participarem nesta guerra ilegal?
E como ignorar que, ao mesmo tempo que os EU se dispõem a desarmar os outros, não ratifiquem o Tratado de Não Proliferação das Armas Nucleares, continuem o programa da Guerra das Estrelas e se recusem a assinar qualquer acordo para deixar de produzir minas anti-pessoais que têm estropiado e matado milhares de civis?
Como esquecer que o governo norte-americano, considerando-se acima de todos, não ratifica o Tratado de Quioto, quando tantos se esforçam por limitar a emissão de gases com efeito de estufa, ou como ignorar que impõe aos outros regras económicas, mas as viola sempre que colidem com os seus interesses nacionais?
Que nova ordem internacional nos propõem? Será que o mundo ganhará em depender cada vez mais da obscena vertigem imperialista de Bush?
É a este Império que Durão quer entregar a alma de Portugal espezinhando o sonho europeu?

5.
A não ser em legítima defesa, não creio que a guerra resolva alguma coisa. As bombas não são varinhas mágicas de fazer democracia, são instrumentos de sangue, morte e destruição.
É cada vez mais difícil acreditar na inocência e nas boas causas da política externa dos EUA e na justificação “humanitária” de intervenções como a que está anunciada sobre o Iraque.
As verdadeiras motivações são de domínio geoestratégico desta região do mundo. E, sobretudo, de controlo das fontes energéticas, na sequência do relatório do Grupo de Desenvolvimento da Política Energética Nacional dos EUA, redigido por Richard Cheney e publicado em 17 de Maio de 2001. E esta guerra cheira a petróleo que tresanda!
Mas, também, a certeza de que o que agora se vai destruir vai trazer a oportunidade para o chorudo negócio da reconstrução. 100.000 milhões de dólares é uma estimativa que anima o sector da construção civil dos EUA e seus aliados!
Pelo meio, mais de 500.000 mortos iraquianos: peanuts!

6.
Bush saberá que o Iraque tem tão perigoso armamento. Porque o forneceu e porque a CIA o confirma. É provável que Saddam tenha armas de destruição maciça, tal como a Coreia do Norte, a Índia, o Paquistão, Israel...
Mas, qual é o país que tem o maior e mais sofisticado arsenal de armas de destruição maciça do mundo?
E porque é que essas armas nas mãos de Bush e da extrema-direita americana no poder são inofensivas e as outras nas mãos de Saddam são perigosas? Saddam não está a atacar ninguém, mas são os EU que se preparam para invadir o Iraque e instalar aí as condições para o controlo militar e político da região e das principais jazidas de petróleo.
Quem foi, afinal, o único país do mundo que usou a bomba atómica contra populações civis? Que o digam os mortos e os estropiados de Nagasaki e Hiroshima.

7.
Depois de um encontro com o Papa em 19 de Fevereiro, Kofi Annam afirma que a guerra só é concebível se a alternativa for pior. O relatório de Hans Blix admite que estão a ser feitos progressos nas inspecções e que não existe qualquer evidência da preparação de armas nucleares pelo Iraque. Pedem mais tempo. A França e a Alemanha não se cansam de apelar a uma solução pacífica. As Nações Unidas consideram que o desarmamento está a ocorrer e as inspecções funcionam. Mas, impacientes, os EU já decidiram pela guerra desde o primeiro dia em que enviaram para a região as primeiras forças militares.
Durão Barroso oferece as Lajes para palco da Cimeira de Guerra. Portugal fica fragilizado e os portugueses envergonhados por um governo surdo ao seu apelo à Paz. Definitivamente ligado aos agressores, quando poderia ter reforçado o seu papel no plano dos princípios, fica fora da Lei pelas mãos de um Governo estranhamente servil.
Com a certeza de que a diplomacia não vai convencer os Senhores da Guerra, com 250.000 soldados e um arsenal sofisticado e ilimitado às suas portas, como se pode esperar que Saddan destrua todas as armas que possa possuir?
Como irá reagir o tirano Saddan debaixo dos milhares de mísseis do fundamentalista Bush que “não tem apenas a certeza de que Deus está do seu lado, mas recebeu do próprio Deus a ordem directa para atacar o Iraque”? (5)

8.
Ante a mega operação de propaganda e do auto ensurdecer de governantes servis, os Senhores da Guerra fazem manobras de diversão enquanto consolidam um colossal complexo militar às portas do Iraque.
Mas, nesta noite tão triste, uma coisa é certa: apesar dessa máquina diabólica de manipular, milhões e milhões de pessoas, as mais diversas em todo o mundo, não reconhecem justiça nem propósito aceitável nesta guerra e, pelas formas mais criativas, formam uma onda única de humanismo, de apelo à concertação e à paz.
Porque o único desafio que vale a pena para os homens civilizados é a construção da paz, e não dar alimento à saga louca de multiplicar a morte!



1. In Público, edição de 2003.01.05
2. Nuno Guerreiro, in “Os Senhores da Guerra”, Grande Reportagem, edição de Junho de 1999
3. Alfredo Barroso, in “Bombas novas”, Expresso, edição de 2003.03.01
4. Edurado Prado Coelho, in “A guerra mais uma vez”, Público, edição de 2003.02.11
5. Frei Bento Domingues, OP, in “A voz de Deus”, Público, edição de 2003.03.16

Bush admite que argumentos para a guerra estavam errados

O Presidente dos Estados Unidos, George W. Bush tem espiões espalhados pelos quatro cantos do mundo. Há quem acredite que o faz por bondade…
Eles andam por aí. Nenhum de nós está protegido dos seus olhares indiscretos e das suas conclusões precipitadas ou condicionadas ideologicamente pelo Império.
Andam por aí e são incompetentes. Bush vem reconhecê-lo, admitindo no passado dia 14 que "grande parte das informações [de espionagem] que justificaram a guerra do Iraque estavam erradas".
"O teor da informação de que os EUA dispunham sobre as armas de destruição maciça no Iraque era a mesma de muitas outras agências internacionais, e é verdade que essa informação acabou por revelar-se errada", reconheceu Bush. "Como Presidente, também é minha a responsabilidade de corrigir os nossos erros e reformar os nossos serviços secretos, e estamos a fazê-lo."
O maior erro dos EUA é o de tentar hegemonizar tudo e o de se achar no direito inalienável de interferir e condicionar o quotidiano e a história dos outros países. Ficamos a saber que esse erro está para durar. O que é preciso é tornar os espiões mais competentes para que não se note tanto a genética belicista e agressora da confederação de estados que se apresenta como o mais importante laboratório da Democracia.
Por isso, apesar da incompetência dos espiões, vemos Bush defender como certa a sua decisão de invadir o Iraque à margem do Direito Internacional. Como é possível um pressuposto errado justificar uma alegada decisão certa?

Dois anos de guerra, um país arrasado, violência diária... Como se corrige o destino de mais de trinta mil civis iraquianos e dois mil soldados norte-americanos mortos?

15 dezembro 2005

TRABALHO DE EQUIPA

O Formidável e o trabalho em equipa!

14 dezembro 2005

PERGUNTAS AO VENTO QUE PASSA

Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?”
Bertolt Brecht

1. Como muitos Poveiros, sou favorável à requalificação da Avenida Mouzinho de Albuquerque, tal como de tantas outras zonas da cidade e do concelho, independentemente das soluções estéticas e funcionais a adoptar.
Quanto ao Parque Subterrâneo, tenho dúvidas fundadas e, expressá-las, não pode ser um delito de opinião, mas um direito cívico e, em certa medida, um dever de cidadania.
Uma coisa é certa, a prioridade deve ser dada aos direitos de ACESSIBILIDADE e de MOBILIDADE. A acção política deve orientar o trabalho técnico e o investimento público para assegurar estes direitos, antes de mais.
O número de automóveis a circular no Centro da Cidade aumentou assustadoramente! A carência de aparcamento é proporcional! A Póvoa tem um problema de saúde: tem muita gordura no sangue, o que é uma maneira de dizer que está invadida por carros a mais para a capacidade da sua estrutura viária! Começa a ficar insuportável…

2. Uma regra básica do Desenvolvimento Sustentável é Pensar antes de fazer e pensar globalmente para actuar localmente.

Será que a Câmara da Póvoa tem consciência de que o exagerado número de carros no Centro da Cidade é responsável pela poluição do ar, pelo stress e pela insegurança, dificulta a mobilidade e aumenta as perdas de tempo na circulação?
Será que a única maneira de se aceder ao Centro deve continuar a ser de automóvel?
Para se ter melhor mobilidade deve-se ou não reduzir o número de veículos particulares no Centro da Cidade?
Como se faz isso? Não será criando um sistema intermodal de transportes públicos e parques periféricos gratuitos e atractivos?
Quais são os grandes eixos da política de transportes da Câmara Municipal? Limitar o acesso dos carros particulares ao Centro, tornar mais atractivos os transportes públicos?
Que medidas tomou a Câmara para reduzir o trânsito automóvel no Centro da Cidade?
Em vez de construir mais parques periféricos não é verdade que, recentemente, acabou com um para instalar um posto de abastecimento de combustíveis?
E quais são os principais objectivos da política de estacionamento da Câmara?
Será que é construindo cada vez mais parques no centro que se resolve o problema do aparcamento?
Mais e mais parques no Centro resolvem os engarrafamentos, a lentidão da circulação, a poluição do ar, a segurança dos peões, o stress dos condutores?
O Projecto Europeu SMILESustainable Mobility Initiatives For Local Environment - propõe a redução dos parques no centro das cidades e a promoção de parques periféricos gratuitos! Porque não seguir este conselho?
Deve construir-se o parque subterrâneo da Avenida para responder à falta de estacionamento, ou deve-se reduzir as necessidades de estacionamento reduzindo o número de veículos a circular no Centro da Cidade?
Onde estão os estudos que demonstram a necessidade, a inevitabilidade e a urgência de construir mais um parque central e, concretamente, na Avenida Mouzinho de Albuquerque?
Se este parque é um equipamento indispensável, porque não faz parte das Intervenções Estratégicas e Prioritárias do Plano de Urbanização?
Onde está o Plano de Mobilidade e Plano Estratégico de Transportes para a cidade e para os subúrbios?
Qual a relação desses planos com os parques centrais e os parques periféricos?
Para quando um sistema de transportes públicos que seja confortável, regular, frequente, rápido, não poluente e económico?
Para quando a construção de novos parques periféricos?
Para quando a construção do Centro Intermodal em Barreiros e o prolongamento do Metro até esse equipamento estratégico?
Quanto aos residentes, qual é a dimensão da sua carência de aparcamento e que soluções para resolver o seu problema?
Quantos residentes estão disponíveis a adquirir ou a alugar aparcamentos em soluções realizadas em colaboração com o Município ou com Investidores Privados?
Por que não fazer parcerias com os residentes interessados e construir parques em vazios urbanos, como o do antigo Quartel na zona da Matriz ou o do miolo do quarteirão definido pelas ruas António Graça/Serpa Pinto/Elias Garcia/Patrão Sérgio?
Quanto aos que se deslocam diariamente para a Póvoa, quem são as pessoas e quantas são?
Quais são as razões que as trazem ao Centro da Cidade? Quantas vêm em movimentos pendulares casa-trabalho e trabalho-casa e como se deslocam? Têm alternativa?
Se vêm de carro, quantas estão dispostos a pagar diariamente cerca de 8 euros pelo estacionamento num parque central?
Estariam disponíveis a vir, antes, de transporte público, se existisse, se tivesse qualidade e fosse de baixo preço?
A Câmara da Póvoa leva em atenção as necessidades de alguns públicos alvo, como é o caso de trabalhadores, crianças, estudantes, reformados e pessoas com deficiência?
Qual é, de facto, a dimensão da carência de aparcamento dos visitantes?
Por outro lado, além do aparcamento ao longo das ruas, qual a capacidade actual dos parques que existem no Centro da Cidade? Qual é o seu índice de utilização? Quais são as suas horas de maior carga? Quais foram os custos de investimento? Quais são os custos de manutenção? Quanto custa ao utente a sua utilização?
Onde está o estudo de viabilidade económica, no plano da execução e manutenção do equipamento e das áreas conexas, correspondente financiamento de imediato e a prazo? Afinal, a obra é paga completamente pelo investidor privado, como se fez crer, ou a Câmara pagará parte dela? Que parte? Com que dinheiro?
Onde está o estudo de impacto ambiental da obra? Que sentido faz deixar a sua elaboração para os concorrentes privados que, dificilmente, serão independentes e isentos?
Onde está a avaliação do impacto da materialização da obra no terreno, quanto às suas implicações no normal funcionamento da cidade e, em concreto, na zona onde se insere?
Os Poveiros, nomeadamente os comerciantes, lembram-se do que foi a Obra da Junqueira? Já imaginaram uma situação várias vezes pior, durante pelo menos dois anos, numa via estruturante que atravessa toda a cidade e é indispensável ao trânsito automóvel?
Será que se deve impor sacrifícios às pessoas sem se ter a certeza de que esta é a solução indispensável e única? E será que se justifica tal sacrifício num momento de grande crise no Comércio local, provavelmente agravada em breve com a abertura próxima do Nassica?
Mas, se feitos estudos sérios e isentos, for mesmo preciso mais um parque no Centro da Cidade, porquê na Avenida? Por que não na Antiga Cadeia, onde é possível uma grande capacidade de aparcamento em diversos níveis e onde a sua construção não causaria qualquer perturbação à quotidiano da cidade?
E, finalmente, já repararam que o centro da Póvoa é muito pequeno, que a esmagadora maioria dos serviços, dos equipamentos e das lojas comerciais se concentra num círculo com um quilómetro de diâmetro? E que o percurso mais longo se faz a pé, em pouco mais de dez minutos?

Tantas perguntas. Outras tantas respostas por dar!

3. “Daqui resulta que as intervenções na circulação devem ser enquadradas pelos seguintes objectivos: aposta em medidas de gestão de tráfego no centro urbano; construção de alternativas de circulação e de estacionamento na periferia imediata, por forma a evitar o excesso de concentração automóvel no centro urbano; reforço da rede de transportes colectivos, articulada com os locais de oferta de estacionamento e com as estações do futuro metro, garantindo uma oferta diversificada na circulação urbana.”

Faço uma proposta ao Senhor Presidente da Câmara, Dr. Macedo Vieira. Será capaz de identificar a origem e o autor desta afirmação?
J.J.Silva Garcia

08 dezembro 2005

UM HOMEM NÃO SE RENDE

Um destes dias disse a um amigo que "a minha experiência como Vereador está a ser interessante, mas é triste ver como as maiorias absolutas potenciam a arrogância que, normalmente arrasta a estupidez e a mediocridade..."
Ele retorquiu, trazendo à conversa o desabafo de Rui Barbosa, antigo jurista brasileiro, diplomata, político de grande cultura e amor à pátria que, numa das suas manifestações na tribuna do Senado, ao ser vítima de ataques caluniosos, em 1914, terá exclamado: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto"!
Em momento de desalento talvez haja essa tentação.
Mas, como diz Manuel Alegre “Um homem não se rende. Talvez seja por isso que estou aqui, não sei ao certo onde nem desde quando, talvez desde sempre, no meio de um quadrado, cercado e sozinho, mas não vencido.Algures alguém me reabastece. Algures sabe que não me rendo.Todos os dias, pelas seis da tarde, aperta-se o cerco. Todos os dias, à mesma hora, me coloco em posição. É estranho que não me acertem, verdade seja que também não sei se alguma vez atingi o inimigo, se assim lhe posso chamar. Chego a perguntar-me se não é sonho, se tudo não é apenas um pesadelo e se de repente não vou acordar.Seja como for, a guerra continua. Em sonhos ou não, continua. São quase seis da tarde e sinto que eles se aproximam. Todos os dias é assim, todos os dias defendo o meu quadrado.- És um homem sozinho e a tua guerra está perdida, gritam eles. Sei muito bem que estou sozinho. Mas enquanto me bater a guerra não está perdida, ainda que se me perguntassem que guerra é eu não soubesse ao certo responder. Diria talvez que é a guerra de um homem no meio do seu quadrado. Um homem que se bate, talvez em sonho, porque tudo se calhar é sonho. Sonho de um sonho, lembro-me de ter lido algures. Que importa? Sonho ou não, eles aí estão, tenho de defender o meu quadrado, não há outro sentido senão este, lutar até ao fim, um homem não se rende, não seria bonito, seria, aliás, se me permitem, uma falta de educação, uma grande falta de educação.

07 dezembro 2005

A ARTE DO ENGANO

Não concordo nada com o candidato presidencial da Direita que pretende que duas pessoas sérias e competentes diante da mesma informação produzem a mesma conclusão.
A vida demonstra-nos que a informação é lida e reflectida na circunstância, segundo a perspectiva da complexidade pessoal, da história, dos valores, dos princípios e as suas causas que de cada um.
E se cada um é único na diversidade colectiva, porque haveria de existir uma única conclusão?

02 dezembro 2005

CIDADE E DEMOCRACIA

1.
Será a cidade o resultado de um acto colectivo?
A sua materialização no espaço é feita por múltiplos e diversos agentes. Mas, será que basta a existência de Planos e Regulamentos produzidos pela Administração sem a participação dos cidadãos para que a cidade não seja, pelo contrário, o resultado de uma colagem de acções, descontínuas e sem a marca de um todo coerente?

Os actores directos no fenómeno da construção (serviços técnicos da administração, proprietários do solo, promotores particulares, empresas de promoção imobiliária, técnicos e construtoras) formam um grupo muito reduzido no contexto de uma população sobretudo consumidora. Como se pode afirmar, então, que a sua intervenção na prossecução dos respectivos interesses pessoais e empresariais é suficiente para que a cidade seja um acto colectivo?

Se o espaço público (estrutura viária e espaços construídos e naturais, de estar e de contemplação) e os equipamentos, são património de todos, como se pode considerar a cidade um acto colectivo sem a participação activa e objectiva da generalidade dos cidadãos na sua concepção?

Por outro lado, não há sistemas de ideias nem Planos de Ordenamento sem orçamentos que os viabilizem. Como construir, então, o orçamento de uma cidade? No contexto da Democracia Representativa o Executivo Municipal tem legitimidade para definir os investimentos locais a fazer. Mas, será suficiente este orgão eleito decidir sozinho o que fazer e como fazê-lo para que se cumpra o interesse colectivo?

Não será excessivamente redutor e pobre que o único mecanismo de participação reservado aos cidadãos seja a ida às urnas, onde, à posteriori, pode manifestar acordo ou reprovação pelo trabalho geral desenvolvido por um qualquer Executivo num dado período de tempo? Depois das coisas feitas..., cada vez mais afogados pela euforia do marketing eleitoral, que, teimosamente, faz que a propaganda valha mais que a informação, o esclarecimento e o debate, e faz ganhador quem tiver mais meios para hipnotizar...
O que nos tem dado e onde nos levará esta democracia dos cinco minutos?

Sem mecanismos de participação que dêem continuidade e maior fundamento à legitimidade dos eleitos, como pode assegurar-se que os Executivos sejam imunes à tentação de ficar cúmplices de mãos invisíveis e dos interesses imobiliários, promovendo as políticas urbanas que lhes são mais convenientes?
Num certo sentido, a ausência de um debate alargado sobre o modelo de cidade, apoiado em leituras globais e pontuais, que envolva toda a comunidade, é sinal de menoridade política e de autoritarismo no exercício do poder.

2.
A Democracia não é um facto estabelecido de uma vez por todas, é uma dinâmica.
Temos observado que, numa perigosa deriva que prejudica o projecto de um municipalismo democrático, a prática das administrações municipais actuais tem sempre algo de despótico e de autoritário. A par da surdez, de uma burocracia insuportável e do desprezo para com os cidadãos, manifesta-se através de um narcisismo igualmente nefasto. No exercício dos cargos políticos, a generalidade dos autarcas municipais vêem com receio as entidades sociais dos cidadãos, que entendem como algo anacrónico e pouco justificado em si próprio. Simulam aceitá-las apenas para dar uma imagem de participação democrática, mas têm como objectivo integrá-las nos sistemas que eles controlam.

Ao contrário, a vontade de saber e de comunicar, a argumentação pública e a livre circulação de ideias são factores de progresso. Como tal, tem de evoluir. É fundamental e urgente uma atitude do poder local baseada em valores inclusivos e não promotores de exclusão!

É evidente que a surdez autocrática é mais fácil de exercer. Informar os outros, motivá-los a reflectir, suscitar que formulem opiniões, é mais cansativo, exige paciência redobrada...
Mas, é patético considerar-se que um ambiente em que todos tenham opinião seja uma espécie de “embriaguêz da democracia”. Pelo contrário! Quem assim pensa, prefere o estado ébrio ao estado sólido de uma visão moderna, humanista e de vanguarda, que reconhece ao homem o primado de ser actor da História e não mero objecto!

3.
Para uma sociedade evoluída é inadiável fazer a pedagogia da cidade, do debate e da participação!
A cidade tem sido, sobretudo, uma mercadoria, e o solo não é entendido como suporte da cidade mas como oportunidade para materializar um produto...
A cidade é consumida de forma diferente por todos, mas criada apenas por alguns! No entanto, todos vivemos na cidade e sabemos o que nos incomoda e o que nos faz falta, o que nos dá prazer e suscita encantamento.

Por isso, a questão é saber como formalizar a participação, e que mecanismos criar para a promover e a assegurar. E, no que concerne às questões da cidade, que tipo de debate pode ser estabelecido com os cidadãos e que temáticas se podem abordar?
Tudo passa por promover um plano de acções de informação e reflexão. Dirigindo-se e envolvendo primeiro pequenos grupos, organizados em cada uma das partes urbanas identificáveis dentro do perímetro da cidade, e, depois, assembleias cada vez mais amplas!
Isso precisa de tempo e de informação, numa dinâmica em que é indispensável utilizar os recursos materiais e humanos do Município, nomeadamente os Técnicos que trabalham no planeamento e na gestão da cidade. Estes, por sua vez, também podem ganhar com as sugestões dos cidadãos e, assim, produzir documentos mais adequados à realidade local. E, ainda, será enriquecedor proporcionar-se o contributo de especialistas convidados que abordem as mais diversas questões do fenómeno do urbanismo.

Num primeiro momento, como experiência piloto no quadro do município, esta dinâmica poderá começar, pela criação de um Gabinete de Coordenação de Políticas Locais, composto pelo Presidente da Câmara, pelos Presidentes de Junta e por assessorias técnicas, que reunirá periodicamente, tendo como objectivo o diagnóstico sobre as fragilidades concelhias, a elaboração de soluções, a definição de prioridades e a avaliação permanente da implementação dos projectos.
Esta parceria estratégica na coordenação das acções a desenvolver num determinado concelho poderá ser um primeiro passo de uma participação progressivamente mais alargada à generalidade dos cidadãos e dos seus grupos de referência.

O Princípio da Participação pode ser aplicado em qualquer comunidade, e implica que “todas as decisões sobre o que se tem de construir e sobre como se deve construir devem estar nas mãos dos utentes e destinatários”.

Porque não começar pelo método proposto por Christopher Alexander em “Urbanismo e Participação” que engloba seis princípios de actuação: a ordem orgânica, a participação, o crescimento em pequenas doses, os padrões e modelos, o diagnóstico e a coordenação?

Por outro lado, como criar um sistema de prioridades de investimento realmente eficaz e capaz de produzir desenvolvimento sustentável e coesão social e territorial?
Tenho por convicção que o Orçamento Participativo, experimentado em Porto Alegre e em mais de duzentas cidades brasileiras, é a solução moderna e de vanguarda que constitui um processo criativo fundamental à construção da cidade como um acto colectivo!
O orçamento participativo de Porto Alegre demonstrou ser uma via credível para ultrapassar o impasse entre uma concepção “espontaneísta” e ingénua da participação e uma visão tecnocrática da gestão. A acção que é possível empreender num município, dada a escala local, permite, de forma bastante fácil, realizações concretas, que os cidadãos podem tocar com a mão, tanto em mudanças profundas nas infra-estruturas urbanas como na cultura cívica dos habitantes, no reforço da cidadania.

O Poeta diz que “o caminho se faz caminhando”. Contra todas as âncoras do conformismo oportunista, começar é preciso...


J.J.Silva Garcia



01 dezembro 2005

CÁ 70

Prefiro arrepender-me por ter errado,
do que arrepender-me por não ter tentado.

Provérbio chinês