29 dezembro 2006

Nem Yes-man, nem Post-it…



Orelha quebrada não ouve! E orelha que não ouve, não ajuda o discernimento e compromete a língua no ofício de linguarejar!


1. Há um tempo para tudo…
Houve um tempo, num certo registo de frequência, para analisar a obra numa visão global, para tentar enquadrar o equipamento na cidade e descortinar o seu papel numa estratégia de mobilidade. Nesse tempo, em que se teve em cima da mesa a grande escala, abordar o pormenor só serviria à confusão.
Durante mais de dois anos fizemos perguntas que ficaram sem resposta. O único som que se ouviu foi o da autista decisão de fazer de acordo com o capricho. Com legitimidade democrática, é certo. Mas sem fundamentação científica.
Na maré das perguntas por responder, ficou por explicar como é possível subscrever um Plano de Urbanização que propõe a construção de parques de estacionamento periféricos – o que pressupõem um investimento a sério nos transportes públicos…- e não aponta a construção de qualquer parque de estacionamento de grandes dimensões no centro urbano, e ao mesmo tempo, os exactos responsáveis políticos darem prioridade ao parque não previsto da Av. Mouzinho, não fazerem nenhum parque periférico e nem pretenderem investir tão cedo num sistema de mobilidade sustentável e nos transportes públicos.
A quem decidiu não causou arrepio a contradição com um modelo de desenvolvimento sustentável para a cidade.

2. Agora, o tempo é outro. É o tempo irreversível de materializar um equipamento que, na minha perspectiva continua a ser um erro estratégico, que só terá sentido e utilidade quando e se um dia se transformar em parque para os residentes e espaço residual para os que vêm de fora.
O bom senso recomenda, no entanto, que se aceite a realidade como ela é, quando já nada se pode fazer para a alterar. Fiz o que pude para demonstrar que o parque não é a solução, mas o alimento para um problema voraz. Argumentei de várias maneiras e não convenci!
Ganhou quem impôs a construção do parque, e com ele um modelo de desenvolvimento urbano assente numa estratégia de mobilidade viciada no automóvel particular e por isso, caduca e retrógrada sob todos os pontos de vista, nomeadamente, no plano da racional gestão da energia, do tempo individual e colectivo, da qualidade de fruição da cidade e do ambiente em geral.
A batalha foi ganha pela força contra a Razão!
Permanece a convicção que acredito vir a confirmar-se no futuro de uma outra mentalidade…porque ela não é mais do que a leitura atenta dos problemas idênticos e das soluções que noutros lados se preconizam para os resolver.

3. A obra arrancou há algumas semanas com árvores arrancadas e gemidos de pássaros em debandada, abafados pela estridência das moto-serras.
O meu desejo é que tudo se faça sem incidentes, no tempo previsto e com o menor impacto negativo possível. Se assim acontecer, será menos-mal para todos.
O tempo agora é outro. É o tempo da pequena escala, o tempo onde se podem fazer afinações, introduzir acertos, minorar os impactos negativos e potenciar as possibilidades intrínsecas.
Foi neste registo que, por vermos utilidade na articulação entre o parque de estacionamento automóvel subterrâneo e o Teatro Garrett depois de renovado, propusemos à Câmara o desenvolvimento de todas as iniciativas, no plano institucional e no âmbito da definição das soluções técnicas adequadas, com vista a assegurar a ligação coberta entre ambos os equipamentos.
Referimo-nos em particular à utilização da Galeria Comercial Euracini II como canal de acesso pedonal (à cota da cave do lado da Avenida, com ligação de nível do lado da Rua José Malgueira) ao novo espaço cultural, solução que também interessará à dinamização de uma parte deste centro comercial que se encontra praticamente abandonada. Referimo-nos, ainda, à utilização de parte da cave e do rés-do-chão dos edifícios que vierem a ser construídos no espaço da actual Garagem Avenida e no terreno contíguo, para assegurar acessos de serviço à zona posterior do palco do Teatro Garrett.”
Com idêntico objectivo, propusemos também “a ligação directa, ao nível da cave, ao Mercado Municipal, assegurando, num primeiro momento, a ligação coberta entre ambos os equipamentos bem como um espaço para parqueamento de carrinhos de compras e, posteriormente, o eventual acesso de veículos, se, na necessária reformulação do Mercado Municipal, tal se vier a justificar, para aparcamento automóvel ou para serviço de cargas e descargas”.
As ligações propostas são úteis aos utentes, aos comerciantes e, se quisermos, tornam mais atractivo o uso do parque e, por conseguinte, mais interessante a sua exploração comercial.

4. Diante da proposta, o Vice-Presidente da Câmara emudeceu na reunião. Todavia, a seguir terá dito aos jornalistas que estas propostas
“estão a ser colocadas fora de tempo e apenas demonstram uma tentativa de colagem à obra que até aqui foi criticada pelos socialistas”.
A reacção do número dois do Executivo é típica de quem gostaria de ter tido a ideia e não teve. Mas, mais útil seria avaliar a sua substância, porque há que fazer dos problemas oportunidades com vista ao bem comum!
O Vice-Presidente sabe que seria impensável fazermos qualquer colagem a uma obra errada. Sempre defendemos a requalificação da Avenida, mas, numa perspectiva de mobilidade sustentável, continuamos a considerar um erro a prioridade dada ao parque sobre a criação de um sistema de transportes públicos urbanos moderno, confortável e eficiente. Esse erro, que resulta de um capricho, é património da Maioria! Não temos qualquer intenção de o usurpar.
A mensagem é simples e só orelhas quebradas não ouvem: o que se pretende simplesmente é fazer de um erro uma oportunidade, minorar os efeitos negativos e potenciar algumas virtualidades. Em nome do interesse da cidade e numa atitude construtiva, e por isso, responsável.
Fora de tempo está de certeza um equipamento que nega as mais recentes orientações da União Europeia e da Universidade sobre a mobilidade nos centros urbanos.
A nossa proposta de melhoramento ainda vai a tempo!

5. O que fazer quando se é de pensamento livre, investido de postura institucional, usando a razão e o discernimento? Analisar a proposta, ouvir outras opiniões, avaliar os prós e os contras e, no caso de, lhe reconhecer valimento, tudo fazer para levar a bom cabo a ideia, venha donde vier!
Infelizmente, os “donos” da obra dizem que não admitem introduzir a melhoria, juntando outro capricho ao Capricho!
Assim se vê a diferença de duas atitudes: por um lado, a de quem, no plano de uma visão global da cidade e do seu desenvolvimento sustentável, já lutou que chegue para tentar demonstrar um erro estratégico e que, passado o debate e confirmada a decisão de avançar apesar disso, pretende contribuir de forma construtiva para fazer do erro uma oportunidade; por outro lado, a de quem, tendo o património da ideia de construir o parque, tendo recusado sempre responder às perguntas suscitadas por tal iniciativa, tendo o poder para decidir construir, e estando a fazê-lo, se recusa a melhorar a própria criação furtando-se de novo no acessório e repudiando o essencial.
Na primeira atitude há convicção, humildade e vontade de construir. A segunda tresanda a falta de visão global e perspectiva de futuro, arrogância e a falta de lucidez.
Na primeira, respeita-se a cidade e os seus destinatários. Na segunda, esmaga-se tudo a um ego insaciável, num frémito de afirmação autocrática do poder.

6. Uma coisa é certa e objectiva: a proposta apresentada é tecnicamente possível e funcionalmente desejável! A ideia está lançada.
A Maioria não tem o direito, tem o dever de governar! Cabe à Maioria assegurar a sua concretização!
Não há impedimentos temporais quando o benefício é evidente e a circunstância o permite.
Apenas uma sugestão: não a atirem para o fundo da gaveta com argumentos tão frágeis e descabidos que não auguram nada de bom!
No plano político, seria hipócrita e irresponsável fazê-lo!

6 Comments:

Blogger renato gomes pereira said...

"Há um tempo para tudo…"

Há sempre tempo...

Um abraço e até para o ano!

Eh!eh!

29 dezembro, 2006 19:05  
Anonymous Anónimo said...

Parabéns, arquitecto.
Excelente artigo e excelente sugestão para tentar transformar num mal memor aquilo que não devia sequer ter sido iniciado.
Mas não espere que os donos da cidade admitam sequer ponderar o aproveitamento das suas ideias.
Seria reconhecer que das suas luminosas cabeças não tinha saído obra perfeita.
Mas como seria isso possível?
Não foram eles sufragados?
Não....Não conte com isso.

29 dezembro, 2006 23:07  
Anonymous Anónimo said...

Antes de mais quero felicitá-lo pelo excelente texto, em que me chamou a atenção o "donos da cidade"; realmente eles agem como se fossem donos da cidade, mas acrescentaria mais uma coisa, nós (Poveiros) nem sequer empregados deles somos, somos escravos pois nós a que os sustentamos sem ter nada em troca. Não tenho partido, não ligo nada a politica, mas sou Poveiro e sou honesto, e tenho agora a certeza absoluta que fiz bem em votar no Sr. Garcia, nas ultimas eleições. Candidate-se ás proximas e pode ter a certeza que irá ser o presidente de todos os Poveiros de bem. Parabens pela coragem e nunca desista pois tem muita gente que o apoia.

António Dias

30 dezembro, 2006 16:59  
Blogger José Leite said...

Caro arqº Garcia, ainda não percebeu que quem foi sufragado pelos votantes quer ter o exclusivo do mando, que é para poder arremessar mais tarde: "eles não fizeram nada, andaram para ali a dormir na forma, são uns incompetentes!"?.
É óbvio que o que se passa aqui passa-se noutros lados. A ânsia de protagonismo é uma obsessão doentia.
Conheço um caso em que tinha sido feito um convite a um cidadão para falar na rádio local. O presidente (não é na Póvoa) foi ter com os donos dessa rádio e o que se passou ao certo não se conhece bem mas essa audição foi cancelada e o jornalista responsável demitiu-se por não admitir ingerências abusivas no seu trabalho...

O silenciamento dos adversários é um tique totalitário de que sofrem muitos autarcas.
Querem falar e verborrear em tudo o que é sítio: jornais, rádios, TV's,na ânsia desesperada de "abafarem" (pela quantidade e não pela qualidade) os opositores.

Aceitar sugestões dos adversários?
São tão fanáticos que "isso" seria desmentir o labéu tantas vezes lançado : incompetentes, sem ideias, "esquizofrénicos"...

Era caso para perguntar: Não seria preferível um executivo monocolor?

Com estes sectarismos (fundamentalismos egocêntricos?) não há democracia local. É o "quero, posso e mando!" mais abjecto, mais intolerante, mais autista...

O ordenamento jurídico-institucional tem, também ele, uma quota parte de responsabilidades no estado a que se chegou...

Estou neste momento tentando colocar em livro algumas considerações sobre esta temática, que conflui, inexoravelmente, em corrupção & mais corrupção.

Já fui alvo de uma "COÇA", com um indivíduo a acusar-me (na blogosfera...) de eu andar a insultar a sua esposa, a fazer-lhe ameaças, sei lá, tudo falsidades sem conta a que não dei resposta; melhor, pedi a intervenção do ministério público para que não se diga "quem cala consente"!

Julgo que o problema que existe aqui na Póvoa é grave, mas tem como substracto "institucional" uma legislação permissiva, pouco objectiva e susceptível de malabarismos de cariz pouco recomendável.

Enfim, o poder local, no actual "status quo", está, por causa da legislação reinante, a descambar para o populismo, o nepotismo e o arrivismo mais degradantes!

30 dezembro, 2006 17:06  
Blogger Dimas Maio said...

Arq. Garcia:
Já aqui registei o meu apreço pela sua instruida argumentação. É por essa capacidade que terá de ser celebrado.Como agora, mantenha a sua altivez. Não se deixe enredar na teia da linguagem insultuosa.

Cumprimenta-o
Dimas Maio

30 dezembro, 2006 19:10  
Blogger Dimas Maio said...

Arq.Garcia:

Ia-me escapando aquela da "orelha quebrada".
Levo à conta de uma facécia que, antes de morder, tem graça e revela um espírito jovial. E não há que o levar a mal
Rima e etc. e tal...

30 dezembro, 2006 22:10  

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