23 outubro 2010

É SIMPLES





Todos os dias os ministros dizem ao povo / Como é difícil governar. Sem os ministros / O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima. Dizia Brecht.

Mas é muito simples! Governar afinal é fácil, desde que os banqueiros e os especuladores gostem…

E a história vai-se repetindo vezes demais assim. De uma só vez, numa repetição sórdida, o murro que nos deram no estômago não foi apenas um, mas quatro:
. o Orçamento de Estado vai esmagar em 2011 o quotidiano dos cidadãos mais frágeis: a muitos funcionários públicos vai ser reduzido o ordenado (e não tarda nada que, no sector privado, se emagreçam ainda mais os magros vencimentos…), é-lhe aumentada a taxa contributiva e passam a comprar bens essenciais com um IVA galopante de 6 e 13 para 23%;
. no mesmo dia passam a pagar portagens em estradas onde não há alternativas de mobilidade, um novo imposto travestido de um alegado princípio idiota de génese neoliberal, o do “utilizador pagador”, como se não pagássemos já através dos impostos que já pagámos (mesmo sem utilizar tanta coisa) e do ISP que se paga sempre que se compra combustível, mas sem o qual não é possível os nossos veículos utilizarem qualquer estrada e não apenas vias rápidas;
. para completar a agressão, diante da confrangedora passividade dos governantes, o preço dos combustíveis subiu outra vez, numa escalada especulativa e oportunista, ao arrepio da lógica de relação com a evolução do preço do crude, aquela lógica que usaram para justificar a subida em 2008 / 2009, mas que logo se esqueceram de aplicar para promover a descida que não querem fazer. Como é possível que os combustíveis estejam hoje ao preço de 2008, em que barril de petróleo andava pelos 150 dólares, apesar de andar agora pela metade?

Os banqueiros de ganância obesa e insaciável, grandes responsáveis pela crise que se vive no imediato e ameaça o futuro por muito tempo, mas livres de qualquer sanção graças a uma impunidade obscena, gostam disto tudo! E vêm nas medidas anunciadas por um governo eleito democraticamente (oriundo dum partido socialista!) a maneira de continuar a chafurdar nos milhões de lucros que, despudoradamente anunciam todos os dias enquanto os portugueses desesperam. Gostam tanto destas medidas que, apesar de não terem legitimidade democrática, num dia de descaramento, foram pressionar Passos Coelho a apoiá-las, e no dia seguinte foram confirmar o seu gosto ao Ministro das Finanças! E o que é espantoso é que ambos os atenderam muito normalmente!
No centenário da República, este foi o quarto murro, não apenas no estômago, mas na alma e nas convicções de qualquer cidadão que crê na Democracia e na inalienável prevalência da Política sobre a Economia; o murro da perplexidade quanto a este tolo modo contemporâneo de entender o governo do povo, pelo povo e para o povo!
Já sabemos que é preciso combater o despesismo, o desperdício, a falta de eficiência associados a tanta coisa que se faz, não para responder a problemas do nosso quotidiano, mas para assegurar benesses e vantagens às clientelas, num oportunismo que é sempre asqueroso. E para isso não é preciso estarmos em momento de crise e de recessão.
Contudo, em vez de se combater em primeiro lugar as cumplicidades e os privilégios, e de dar prioridade a condições objectivas para que se crie riqueza e se distribua bem para evitar a pobreza, o que se faz é aumentar as dificuldades de quem já tem menos, contando que fique satisfeita a ganância dos especuladores e dos banqueiros.
A História de sempre e as histórias recentes demonstram que isto não vai ficar por aqui. O mais certo é confirmar-se a recessão, para logo a seguir virem mais medidas de arrogante dureza para afligir quem já está aflito.
Mas, se o povo paga as aventuras dos banqueiros, então passe o povo a mandar na banca, colocando-a definitivamente ao serviço das pessoas!

Numa cegueira incompreensível, continua a esticar-se a corda, por imposição dos donos do mundo! Embaladas pela ideia perigosa de que os portugueses são gente de brandos costumes, não se vislumbra que a iniquidade, quando começar a ser verdadeiramente insuportável, pode ter consequências incalculáveis.


(publicado pelo autor no Comércio da Póvoa, edição de 2010.10.20)

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

O grande problema é que ano passado eu comprava laraja do Algarve a 0,38€, este ano pela mesma laranja estou a pagar 1.35€. No leite + 0.10€,no arroz + 0.10€, no gasoleo + 0.10€ nas portagens mais o que eles dizem.
e Eu pergunto :
- Como vão as familias combater a crise?
Quando olho para os nossos politicos tambem não vejo nimguem com capaz de tomar as rédeas.Em termos politicos acho que o que governa é a CONFUSÃO. Nada é feito com consciência, desde esta lei das portagens , aos subsidios, ás parcerias publico privadas, á energia eolica que sai bastante mais cara do que a outra e quem paga é o consumidor e não a EDP, enfim

José Tinoco

29 outubro, 2010 11:29  

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